AS ‘MADURAS’ CRIANCICES DOS
DISCÍPULOS
Caio Fabio
No caminho de
terra e areia sobre o qual Jesus andava com Seus discípulos, a medida em que o
tempo os deixava a vontade para ventarem o que existia em seus interiores
diante de Jesus, o que neles havia de oculto, para eles mesmos, passava a ser
revelado.
Isto porque
talvez apenas Pedro e Mateus, desde sempre, tenham sido quem eram, do ponto de
vista público. Afinal, já eram homens ‘definidos’ em suas personalidades. Os
demais, entretanto, foram se mostrando devagar...
O moço meigo,
que fazia carinho em Jesus, irmão de um outro homem bom (João e Tiago,
respectivamente), ambos desejavam supremacia sobre os demais. Prova disso é que
a mãe deles pediu a Jesus para que os seus dois filhos tivessem lugares à
direita e à esquerda do Senhor no reino de Deus. Ora, dificilmente uma mãe
faria algo assim sem que isto preexistisse como uma certa inclinação dos ‘meninos’.
Prova de que
estavam meio surtados é que quando desceram com Jesus do monte onde houve a
Transfiguração, logo a seguir surge a conversa de quem entre eles era o maior.
Depois veio o surto de autoridade divina que os fez dizer que haviam proibido
alguém que expulsava demônios, de o fazer, apenas porque ‘não andava com eles’.
Não era nem mesmo um ‘não anda contigo’ o que eles disseram. Sim, com extrema
facilidade, apenas porque haviam recebido certas deferências de carinho e
amizade, e também de investimento de Jesus neles, eles já se sentiam
“especiais”, e já falavam em nome de Jesus até contra Jesus, e já eram os que
sabiam das coisas, os que decidiam quem era quem..., os que agora eram ‘sócios’
da revelação..., esquecidos de quem eram: meninos empolgados e ainda
inconseqüentes. Sim, se sentiam como aqueles que olham para Jesus e dizem ‘nós’
como quem ‘inclui Jesus’; esquecidos de quem eram: apenas os convidados e os
incluídos pela Graça Inexplicável.
Além disso, no
prosseguimento do mesmo surto, João se enche de um ‘poder’ tão estranho ao
espírito de Jesus, que deseja fazer cair fogo do céu para consumir os
samaritanos.
Meu Deus! Que
viagem fez esse menino, João, até virar homem, e dizer que quem ama é nascido
de Deus, e quem não ama, antes odeia, esse nunca nasceu de Deus; pois, Deus é
amor!
É também o
caso de Pedro. Depois de exposto a todas evidencias acerca de Jesus; e depois
de ter visto e ouvido tudo o que teve chance de ver e ouvir — de súbito, por
ter tido o ‘privilégio’ na Graça de discernir em Jesus o Cristo, arroga-se, daí
em diante, a dizer o que Jesus deveria ou não fazer de Sua vida, chegando mesmo
a dizer que Jesus estava dizendo que certas coisas futuras (cruz, morte, e até
a ressurreição) jamais aconteceriam, visto que ele, Pedro, jamais permitiria
que Jesus se expusesse a tal besteira.
Assim, após
confessar aquilo que somente por ‘revelação divina’ se poderia saber, Pedro
agora ouve Jesus lhe dizer, sem meias palavras e sem delicadezas: “Arreda de
mim satanás, visto que cogitas conforme os homens e não segundo Deus!”
Algum tempo
depois, quando a Cruz já se avizinhava, Jesus ‘lhes’ disse que Ele e o Pai eram
Um, e muitas coisas mais acerca dessa intimidade de Deus com Deus. Então Pedro
disse: “Agora cremos; pois agora é que falas claramente...” Jesus apenas olhou
para ele e perguntou: “Credes agora? Pois vos digo que cada um fugirá... e eu
ficarei só... mas não estou só... pois o Pai está comigo”.
É à volta
desse evento que Jesus também advertiu a Pedro dizendo que satanás o requerera,
a fim de peneirá-lo como se faz com o trigo... e que ele abrisse os olhos...
embora Jesus tenha dito que orara por ele, para que sua fé não falecesse.
Ora, o
resultado dessa ‘coragem’ espiritual e humana de Pedro e dos demais, incluindo
os Filhos do Trovão, João e Tiago, manifestou-se idêntica. Na hora em que o
bicho pegou... cada um correu para sua casa.
Usei esses
dois exemplos (os irmãos Filhos do Trovão e Pedro-Pedra), apenas para falar que
foi assim e que é sempre assim..., mesmo quando se está seguindo Jesus.
O que me
interessa, entretanto, é a paciência de Jesus com esses meninos, que, ‘do
nada’, se fizeram ‘aquilo’ que Jesus disse que não tentassem ser e nem fazer. E
mais: assusta-me ver que num curtíssimo espaço de tempo é possível que os
discípulos se inflem com tais sutis presunções.
Mas Jesus não
desistia deles. Cria que eles ainda fariam muita tolice e que haveria ainda
muita infantilidade (anos depois Pedro teve que ser repreendido por Paulo por
fazer um apostolado de ‘média’ entre os gentios e os discípulos de Tiago de
Jerusalém). Ora, é essa insistência de Jesus na formação da consciência de
meninos a fim de que cresçam e virem homens maduros, aquilo que mais me fascina
na relação Dele com os apóstolos, os quais, muitas vezes, diziam coisas e
afirmavam realidades tão impróprias e ignorantes, que até parecia que eles é
que haviam chamado Jesus para segui-los...
Meu pecado é
tão grande que, conquanto eu precise dessa Graça que investe em mim e na minha
meninice, até que eu me torne um homem maduro em Cristo, eu mesmo sei que me
resta muito pouca paciência quando vejo pessoas fazerem isto comigo. Sim,
comigo que não sou nada e que não dei minha vida pela salvação de ninguém.
Ou seja: é
preciso ser maduro para ver que há muitos, bem intencionados, mas que, sem delegação,
começam a falar por você, ou dizer o que você lhes ensinou como se fosse algo
que os acometeu por ‘osmose’... ou que em nada tivesse a ver com sua doação de
vida e tempo a eles.
Nessa hora, a
maturidade de quem lidera é deixar como Jesus deixou... sem abandonar; pois, um
pouco mais adiante, esses esquecidos acabarão por se lembrar da realidade com
mais precisão.
Sim, quando as
perseguições do mundo real os fizer saber com quantos paus se faz uma cangalha.
Assim, no
Caminho, quem anda mais adiante pela experiência, tem que se revestir de muita
paciência; pois, os surtos de infantilidade são os mesmos que se pode perceber
que marcaram a jornada de Jesus com os discípulos que seriam um dia verdadeiros
apóstolos.
No passado, eu
levava muito tempo para admitir que o que eu via era o que de fato estava
acontecendo. E mais: levava muito tempo para falar o que via. Hoje, entretanto,
sofro muito mais, pois enxergo a bobeira antes dela virar palavra ou qualquer
coisa, mas me contenho; e, quando falo, é apenas quando vejo que a pessoa,
mesmo recebendo toques, não se enxerga no processo interior que nela está se
instalando.
Desse modo, no
Caminho, não há ninguém que não seja forçado a se enxergar e a crescer. E isto
acontece quando a existência nos chama de nossas sombras, expõe as nossas
entranhas e estranhas motivações; ou, muitas vezes, as tentações de poder
latentes em nós.
Nesses anos de
ministério já vi praticamente tudo acontecer. Sim, já vi de quase tudo em
relação a pessoas que receberam anos de investimento... E mais: se eu fosse
ficar ressabiado com tais constatações, não me animaria a fazer mais nada com
ninguém; posto que não apenas cansei de muita criancice, como também,
infelizmente, meu discernimento de espíritos, até desses brandos, cresceu enormemente
nos últimos anos, o que me faz ter que exercitar muito mais paciência na espera
pela chegada da maturidade; pois, quando você não vê nada, é muito melhor e
menos sofrido do que quando você vê o tempo todo, mas deve esperar que a
Palavra e o Espírito tragam revelação interior para esses corações.
Leva muito
tempo pra gente ir deixando as coisas de menino e abraçando o mundo dos adultos
no Reino!
Estou
escrevendo isto porque, muitas vezes, recebo cartas de gente se candidatando a
dirigir ou começar Estações do Caminho; e que sei serem gente boa de Deus; mas
que se vão fazer qualquer coisa comigo, quero logo deixar claro que minhas
sensibilidades para idiotices e buscas de supremacia e poder estão à flor de
minha pele, e, muito raramente, hoje em dia, me engano quanto a isto; embora,
com Jesus, eu esteja também aprendendo que os líderes Dele sempre começam como
crianças bobas e tolas em muitas coisas. E eu mesmo que o diga!
Nele, que é
Aquele que nos quer apenas sendo quem somos e fazendo o quê e como Ele nos
ordenou,
Caio
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